Confissões de um Consumidor I
Tom Valença
Às vezes sinto uma compulsão junkie
irresistível e me seguro enquanto posso, mas parece não haver saída além do
abismo da tentação. E eu que acreditava já estar com o sangue limpo e a alma
lavada!
Num
esforço involuntário, meu corpo leva minha pessoa em busca do objeto de
desejo tão maldito quanto deleitável. Tento passar sem olhar, evitar perceber
que por ele minha vontade lambe o chão e joga a toalha no primeiro round.
Entrementes, o hercúleo esforço esbarra na fraqueza da carne que se consome na
ânsia eminente de um consumo
inalienavelmente vil.
Começo a tremer e minhas mãos suam pelos
pés. Meu coração dispara como um torpedo sem alvo. O ar paira pesado e quase
asfixiado, me rendo a fraqueza da determinação que broxou diante da tentação exercida pelo imponderável.
Em desespero ontológico e patético, rendo-me a secura da boca que sonha uma
fonte iminente, um álibi para saciar a
sede de viver. Às cegas, como um
peregrino procuraria um oásis no deserto,
procuro um mercador de ilusões que esteja afim de lucrar e se divertir
com a minha fraqueza. Enfim, de joelhos diante do oráculo que me decifra as
entranhas enquanto me devora os últimos trocados, estendo os braços para rogar sem escrúpulos e sem vergonha da
humilhação a qual me exporei em público:
- Pelo amor de
Deus, me dá uma coca-cola aí!
Confissões de um Consumidor II
Adoro ler bula
de remédio
só pra saber se consumo
ou se estou sendo consumido