19.09.04 – 2a experiência com a Sálvia divinorum (fumada)
Local- São Paulo; casa de amigos.
Sálvia divinorum- Principal substância ativa: salvinorina
Região de origem da planta: México (Oaxaca)
Relato redigido no dia seguinte à experiência:
Fumei a Sálvia divinorium (“la pastora”, como é chamada na região mazateca do México) pela segunda vez com o um casal de amigos, na casa deles. Quase imediatamente depois da primeira tragada, ainda quando estava segurando a fumaça, já comecei a sentir um forte efeito. Estava de olhos fechados e tive visões de mandalas que se movimentavam dentro da minha mente. Quando abri os olhos, senti como se tivesse acontecido uma espécie de explosão na minha mente, e foi como se “eu” tivesse saído de mim. Tive a estranha sensação de que “eu” não estava mais em “mim mesma” ou “dentro de mim”. Era como se “eu” (ou o que posso chamar agora de minha consciência) não estivesse mais no mesmo lugar. Era uma sensação de perda da consciência no sentido dela ir para outro lugar: estar fora de si e observar-se de um outro ponto de vista. Entrei em pânico. Tive medo. Foi horrível sentir que “meu eu” (minha consciência) estava indo embora ou que eu saía de mim, do meu corpo. Eu senti o corpo vazio, como uma caverna escura. Tive a sensação de que meu corpo, e meu rosto principalmente, se desfazia. Eu não era mais eu mesma, perdia o meu corpo e o meu “eu”. Senti um pânico terrível. Não suportei a sensação de estar me desfazendo e me perdendo. Corri para o banheiro. Queria me ver no espelho para saber se “eu” ainda estava lá, no meu corpo. Quando vi minha face no espelho, me acalmei um pouco, mas tive medo de ficar ali, sozinha. Voltei correndo para o quarto, onde estavam meus amigos, para pedir a ajuda deles. Ainda estava bem assustada e me sentia tonta com toda essa movimentação. Sentei. Olhei para o casal de amigos e perguntei algo como “eu estou parecendo bem, estou igual?” Eu queria saber se a minha aparência era a mesma, quer dizer, se era eu mesma que estava ali. Eles responderam que eu parecia bem. Eu segurei na mão deles. A sensação de pânico foi diminuindo. Eu respirei fundo, me recostei, procurei relaxar, lembrando que tínhamos fumado a Sálvia, que o efeito dela dura pouco e que provavelmente ia me sentir bem (“inteira” como antes) em breve.
Acho que todas essas sensações duraram cerca de 10 minutos. Foram as sensações mais fortes. Depois disso, passei a sentir algumas alterações corporais. Sentia meu corpo bastante quente e o meu rosto ficou adormecido, como se eu tivesse recebido uma anestesia por um bom tempo. Minha respiração também estava alterada, mais acelerada, talvez por causa do meu pânico anterior. Mas tudo já estava plenamente sob controle. Tinha retomado minha consciência, meu “eu”. Procurei relaxar mais. Fechei os olhos e tentei fazer alguns exercícios de respiração. Sentia que poderia relaxar ou meditar com facilidade, como se tivesse aberto uma espécie de canal, de link na minha mente para entrar num tipo de estado “zen”. Mas me desconcentrei ao ouvir meus amigos conversando. Eu abri os olhos e comecei a conversar com eles. Provavelmente, se estivesse sozinha ou num ambiente ritual onde não fosse possível conversar com as pessoas, poderia ter tido uma experiência intensa de meditação. Agora penso que talvez a experiência sensorial de desintegração do meu eu (corpo e mente), tenha me colocado num estado de abertura para uma experiência de indistinção ou para o que se chama muitas vezes (em práticas como a ioga, por exemplo) de encontro com o infinito, com o todo etc.
No dia seguinte, além de me sentir extremamente bem disposta, tive algumas alterações em termos de percepções visuais, similares as que se tem no dia que se segue a uma experiência com ácido, embora mais sutis. Percebia algumas imagens (como fotos e ilustrações) com uma nitidez e minúcia muito maiores, observando cada um de seus detalhes. As cores estavam mais vivas e eu podia notar suas várias tonalidades e matizes. Sentia também minha inteligência mais aguçada, a mente alerta e ágil. Definitivamente, a experiência com a Sálvia parecia ter me feito muito bem, como se o mergulho na indistinção e o esquecimento de si que essa substância proporciona (mesmo que por apenas alguns minutos) tivessem me renovado, produzindo a sensação não só de estar experimentando o mundo de uma outra perspectiva mas de estar entrando em contato com ele e com suas “coisas” pela primeira vez.