30/05/2001
Jornal A Tarde - Caderno 2  

 

Televisão
OPINIÃO - Labirintos profanos

Lago Júnior 

 

Labirinto, o programa de televisão recordista em audiência em 2002, em algum lugar do planeta, de repente, sai do ar, sem nenhuma explicação. O mistério e a perplexidade tomam conta da população, até que é publicado um livro contando as 21 histórias já gravadas e que não foram ao ar. Com este mote, o psicólogo baiano Tom Valença abre os caminhos para a literatura e lança Universos Profanos (editora Papel Virtual/PUC-RJ). Mistura de conto, poesia, ficção e reportagem, o livro é um “delírio poético”, como define o autor.


  E é. Um delírio gostoso de ler e com uma lógica muito própria e pertinente. Logo no prólogo, tem-se o equívoco de que, a seguir, encontraremos historietas lineares e de lógica aristotélica, mas que é logo desfeito no primeiro “conto-reportagem-poema”, Antigamente o Tempo. História curta e desconcertante em que o autor mostra-se capaz de fustigar o leitor com uma proposta de escrita sintética, superatual, sem perder o lirismo e a delicadeza de um escritor deliberadamente humanista.

 

  Antecedendo cada história, Tom Valença reproduziu um labirinto diferente (pesquisados ao longo da história, desde a Idade Média), como uma espécie de jogo psíquico com o leitor, e que funciona muito bem para quem estiver disposto a parar e tentar desvendar a saída para o próprio enigma. O psicólogo clínico descarta que tenha tentado imprimir qualquer espécie de dogmatismo profissional no livro, ainda que admita certas influências junguianas. De fato, não há, nas histórias, nada que denuncie psiquismos explícitos e primários, ainda que, de forma subjacente, se possa ler o que (sempre) vai nas entrelinhas.

 

  São histórias bem estruturadas dramaticamente. A maioria, mais densa e surpreendente; algumas poucas, mais simples e até com desfechos óbvios. É também forte a presença daquele velho clichê de misturar ficção e realidade e, neste caso, com momentos em que predominam um ou outro. Vale como ponto de interrogação para o leitor: será que tal história ele tirou do cotidiano ou simplesmente (!) da imaginação?

 

  Valem, também, a contemporaneidade do que é relatado e a forma como o é. O autor utiliza expressões da modernidade, tão comum no vocabulário atual, mas sem empobrecer o texto com maneirismos de ocasião e/ou a repetência de expressões. O livro pode ser lido como um pequeno romance, ou como um livro de contos, sem que perca o sentido, já que as histórias são independentes.

 

  É uma estréia corajosa, a de Tom Valença, 37 anos. Ele sabe disto e não espera agradar a muitos, mas quis, diz, agradar a si mesmo com a publicação do primeiro livro. É uma leitura que intriga, que dá vontade de reler algumas histórias, como a volta a um espelho no qual a gente acabou de se olhar, mas volta para conferir se a sobrancelha está arrumada.
 
 
EDITORA:PAPEL VIRTUAL/PUC-RJ

ENDEREÇO ELETRÔNICO: WWW.PAPELVIRTUAL.COM.BR

TELEFONE: (21) 239-0170