AYAUHASCA:
USOS E ESTATUTOS
O uso ritual de ayahuasca, organizado por Beatriz Caiuby Labate e Wladimyr Sena Araújo. Campinas: Mercado de Letras, 2002, 686 pp.
Mauricio Fiore
A publicação de uma coletânea envolve riscos
proporcionais ao grau de ambição dos organizadores. No caso de O uso ritual de ayahuasca, organizado
pelos antropólogos Beatriz Labate e Wladimyr Araújo, os objetivos da empreitada
parecem ter sido atingidos, não obstante os problemas que podem ser apontados
nos 25 artigos (além da Introdução) que compõem o livro. O primeiro objetivo,
publicar os trabalhos apresentados no I Congresso sobre Uso Ritual da
Ayahuasca, realizado na Unicamp em novembro de 1997, foi ainda incrementado, já
que mais da metade dos artigos foram escritos por pesquisadores que não
participaram do evento. A pretensão mais audaciosa, fazer um balanço das
pesquisas e debates sobre o uso da ayahuasca, gerando discussões sobre o tema,
obteve um resultado satisfatório. Os pesquisadores que lidam especificamente
com a questão devem encontrar lacunas — o que não é surpreendente em uma
coletânea desse tipo —, mas o importante é que, para pesquisadores ou quaisquer
outros interessados, o livro não apenas serve como uma sofisticada e ampla
introdução ao tema, como também passa ser uma obra de referência.
“Ayahuasca”, termo quíchua que significa algo como cipó dos mortos ou dos
espíritos, é um dos nomes dados à bebida preparada com a infusão de dois
ingredientes principais, o cipó Banisteriopsis
caapi e as folhas do arbusto Psychotria
viridis. Seu uso por nativos sul-americanos da região amazônica é
pré-colombiano e tem propriedades psicoativas, ou seja, interfere de alguma
maneira no sistema nervoso central do ser humano. Tal propriedade seria
resultado da ação do DMT (N, N-dimetitriptamina) presente nas folhas do arbusto
e das B-carbonilas e outras substâncias presentes no cipó. Embora a DMT possa
ser rapidamente neutralizada quando ingerida oralmente, as B-carbolinas agem
diretamente nos neurorreceptores que a neutralizam, abrindo caminho para a sua
atividade cerebral, o que explicaria sua atuação psicoativa. No início do
século XX, durante a grande onda migratória para a Amazônia, movida
primordialmente pela borracha, o contato com os índios fez que os “brancos”
incorporassem a ayahuasca em suas crenças religiosas e práticas terapêuticas. A
primeira seita fundamentada no consumo da bebida é fundada por Raimundo Irineu
Serra entre as décadas de 1920 e 30, e a partir daí outras seitas são fundadas,
até que na década de 1960 passam a atrair habitantes dos grandes centros
urbanos, expandindo o uso da bebida pelo Brasil e pelo mundo.
O conjunto de certezas
gerais e introdutórias parece terminar aí. Controvérsias e debates que envolvem
as diferentes disciplinas científicas, dogmas religiosos e concepções jurídicas
fazem da ayahuasca e seu consumo um tema profícuo, que o livro de Labate e
Araújo desenvolve em três grupos de artigos: o primeiro trata do uso indígena
ou “nativo” da bebida, num diálogo direto com a etnologia; o segundo percorre
as diferentes seitas que conferem à bebida papel central, como o Santo Daime e
a União do Vegetal; e um conjunto final de artigos aborda aspectos fármaco e
psicológicos da ayahuasca. Se um dos objetivos do livro era travar diálogo com
outros pesquisadores que não apenas os especialistas no tema, é isso que
buscaremos aqui, ao discutir, mesmo que brevemente, os dados e as análises da
obra.
Os artigos da primeira parte
do livro descrevem sistematicamente o formato dos rituais que envolvem o uso da
ayahuasca — ou “yagé”, nome dado à
bebida por algumas tribos amazônicas. A discussão de temas clássicos da
etnologia como xamanismo e antropomorfismo associa-se ao debate sobre o consumo
de alucinógenos por tribos indígenas. Os artigos de Pedro Luz e Esther Langdon
abordam o significado do uso da bebida em diversas tribos amazônicas, que
conformaria uma espécie de “psicointegridade” (Langdon, p. 68), ou seja, um
tipo de vínculo social primordial estabelecido por essa prática (Luz, p. 63). O
ritual de ingestão da ayahuasca culminaria no momento em que a vida cotidiana é
ultrapassada para se atingir um mundo de “verdade” (Luz, p. 61), onde todas os
elementos da natureza estariam numa mesma dimensão.
Nessa mesma linha, os
artigos de Bárbara Keifenheim e de Luis Eduardo Luna buscam inserir o uso de
ayahuasca no sistema cosmológico das sociedades indígenas, escapando da
separação evolucionista entre magia e religião, responsável por uma série de
equívocos no entendimento de rituais xamânicos ou equivalentes. O primeiro percebe
entre os kaxinawás um ritual sinestésico em torno da ayahuasca, não
necessariamente xamânico (o que envolveria sobretudo o tabaco), com a retomada
de um mito primordial em cuja perspectiva todas as dimensões da natureza
estavam ligadas entre si, perspectiva essa que o segundo discute com referência
ao antropomorfismo. O artigo de Mariana Franco e Osmildo Conceição revela o
aspecto curativo que os seringueiros percebiam na ayahauasca, mais distanciado
de um caráter religioso estabelecido.
Completam essa primeira
parte dois artigos escritos por profissionais da medicina que, no intuito de
defender as “causas” nativas, acabam derrapando nas análises. Germán Zuluaga
argumenta que os povos indígenas que descobriram a ayahuasca (localizados
segundo ele no “piemonte” amazônico) estariam sendo roubados pelo “homem
branco”, que tem usado a bebida de maneira “leviana”. Muito mais preocupado com
“curandeiros charlatães” do que com a biopirataria — questão urgente que ele
apenas menciona —, o autor ignora reflexões teóricas das ciências sociais já há
muito consolidadas e essencializa em demasia termos como “cultura” e
“conhecimento”, alertando para o roubo cultural da ayahuasca de seu
“verdadeiro” contexto indígena tradicional, culturalmente “puro”. Seria muito mais
proveitosa, talvez, uma discussão acerca dos direitos dos povos indígenas aos
conhecimentos farmacológicos que vêm sendo sistematicamente usados pela ciência
de maneira muito pouco regulamentada. Jacques Mabit, não obstante um bom
levantamento sobre o ritual e os efeitos provocados pela bebida, confunde uma
proposta de análise médica ou psicológica com as possíveis revelações
visionárias proporcionadas pela ayahuasca. Ao criticar a aplicação do conceito
de alucinação aos efeitos da bebida, o que seria um erro ou produto de uma
fantasia, o médico francês cumplicia o equívoco de se imaginar que a “eficácia”
da ayahuasca é medida pelo grau de veracidade das visões. Sua discussão sobre
os potenciais clínicos da bebida é decerto instigante, mas a falta de problematização
da relação sujeito–objeto, tão cara à psiquiatria, diminui potencialmente
debates mais objetivos.
A segunda e maior parte do
livro é dedicada às religiões ayahuasqueiras no Brasil, e já no início do bom
balanço bibliográfico feito por Beatriz Labate um fato chama a atenção: somente
aqui se desenvolveram religiões populares não-indígenas baseadas no uso da
bebida. Embora os fiéis não atinjam expressão demográfica nacional, contando
hoje em torno de 10 mil (p. 232), essas religiões se tornaram muito visíveis
publicamente. Se suas origens remontam ao contato entre os índios e os
seringueiros pioneiros que ocuparam a Amazônia, Labate identifica hoje um
possível processo de “daimização” das populações nativas, ou seja, o ritual do
“santo-daime” (outro dos tantos nomes da ayahuasca) tem atraído os descendentes
daqueles que por primeiro teriam apresentado a bebida aos brancos. Englobam-se
sob o termo genérico “Santo Daime” aquelas religiões que se dizem fiéis aos
ensinamentos primordiais de Mestre Irineu, o Cefluris (Centro Eclético de
Fluente Luz Universal) e o Alto Santo, cujas diferenças são bem apreendidas com
a leitura do livro.
Oito artigos fazem uma
discussão detalhada dos elementos simbólicos que compõem o ritual do
santo-daime. No caso das novas seitas pode-se observar, ao lado de um processo
xamânico, uma fusão de elementos do espiritismo e do umbandismo com uma forte
base cristã, mais propriamente católica — e nesse ponto o artigo de Sandra
Goulart tem especial interesse, ao ressaltar nas origens dos cultos ao daime
traços de um catolicismo tradicional do interior do Brasil, marcado pelas
relações de compadrio e aliança. Entretanto, Clodomir Monteiro
relativiza o “sincretismo” que seria a base do Santo Daime, na medida em que a
incorporação pode ter-se dado diretamente por descendentes africanos vindos do
Nordeste, sem concurso da umbanda ou do kardecismo. Deve-se lembrar também que
o contato maciço com populações urbanas a partir da década de 1960, que
resultou na expansão do santo-daime para além dos limites amazônicos, também
influenciou na organização das seitas, com a incorporação, por exemplo, do uso
da maconha. Entre os seguidores de Mestre Sebastião, fundador de uma das linhas
daimistas, o Cefluris (MacRae, pp. 455-457), a “Santa Maria”, nome dado pela
seita à maconha, é considerada sagrada.
Mas se a análise do processo
simbólico e da organização do Santo Daime é um ponto forte dos artigos, a falta
de distanciamento parece bloquear discussões mais profundas. Como uma resposta
à contínua discriminação sofrida pelo Daime, alguns artigos insistem em partir
das respostas da própria crença para legitimar o uso da ayahuasca, de modo que,
como afirmou Lévi-Strauss, a teoria nativa acaba servindo de explicação da
realidade justamente por parecer mais próxima da realidade que se quer explicar1.
Assim, o ritual passa a ser hipervalorizado: ora argumenta-se que só por meio
dele poder-se-ia, de fato, sair do território das simples alucinações
(Monteiro, p. 389), ora se fazem juízos de valor que divisam bons e maus usos
de substâncias psicoativas, situando-se o Daime no primeiro caso (Dias, p.
422). O mesmo pode ser dito dos artigos que tratam da União do Vegetal, dois
deles escritos por membros da organização e um outro por um ex-membro. Nenhum
deles escapou de um tom panfletário que impede uma reflexão analítica para além
de uma questão ociosa: “A UDV é boa ou ruim?” — a ponto de o livro estar
sofrendo uma interpelação judicial da própria UDV! De qualquer maneira, a
densidade descritiva dos artigos dá condições ao leitor de dominar
razoavelmente as formas das grandes religiões ayahuasqueiras do Brasil,
estimulando futuras pesquisas.
A discussão
médico-farmacológica é o centro da última parte do livro. Um tanto irregulares,
os últimos cinco artigos representam muito mais um caminho por onde podem ser
trilhadas novas pesquisas do que uma fonte de dados conclusivos. A UDV dá a
tônica dos três primeiros textos. Interessado em demonstrar a “positividade” do
uso da “hoasca” (nome usado pelos
seguidores de Mestre Gabriel, fundador da UDV), o Departamento
Médico-Científico da seita tem estimulado a produção de pesquisas entre seus
membros: de testes psiquiátricos a estudos clínicos gerais, procura-se
demonstrar insistentemente que entre eles a hoasca não afeta em nada uma vida
saudável; ao contrário, propiciaria, entre outros benefícios, a abstinência em
dependentes de outras “drogas”. O artigo do multidisciplinar Benny Shanon é
audacioso em demasia: busca demonstrar que certos arquétipos universais são
trazidos à tona quando acionados pela ayahuasca. A discussão é, de fato,
interessante, mas a psicologização radical do autor — “o estudo da ayahuasca
pertence, em primeiríssimo lugar, ao domínio da psicologia e, mais
especificamente, à psicologia cognitiva” (p. 633) — não leva em consideração
diversos trabalhos antropológicos que já trataram do tema de maneiras bem
diversas. Encerrando o livro, quem busca uma discussão específica sobre
farmacologia do DMT — na ayahuasca como em outras plantas — vai encontrar no
artigo de Jonathan Ott um excelente estudo introdutório.
Se o objetivo dessa parte do
livro foi trazer o peso dos estudos psicofarmacológicos, uma sugestão para
futuros trabalhos talvez caiba aqui: a inclusão de uma discussão mais profunda
sobre o conceito de alucinógeno, no qual o ayahuasca se enquadra em termos
gerais, que está longe de estar resolvida e se enquadra diretamente na relação
entre ciências médicas e sociais. Basta lembrar que, enquanto muitos estudiosos
ou membros das religiões ayahuasqueiras preferem usar o termo “enteógeno”,
ligado diretamente a uma concepção mística das chamadas “plantas de poder”, a
medicina usa termos como, além do próprio “alucinógeno”, “psicodisléptico”,
“psicotomimético” ou” psicolítico”2.
* * *
Façamos por fim uma reflexão
a respeito de um tema que poderia ter sido mais debatido ao longo da coletânea,
e que só foi tocado pelo artigo de Edward MacRae, na verdade um pleito pela
tolerância para com as religiões ayahuasqueiras. A lógica que parece guiar os
artigos do livro é a de que o uso da ayahuasca não pode ser visto como um
consumo qualquer de psicoativos, por envolver rituais religiosos tradicionais.
O próprio título do livro restringe o tipo de uso de ayahuasca — ritual — que
se pretende discutir. Ora, os rituais são um objeto clássico das ciências
sociais, principalmente da antropologia, mas cuja definição precisa não é
consensual. O fato de os rituais terem sido pensados primariamente como
diretamente relacionados com os aspectos religiosos ou místicos não deve levar à
falsa idéia de que estão sempre relacionados aos domínios do sagrado3.
Para Edmund Leach, pode-se entender ritual como um ato ou uma sucessão de atos
prescritos e não instintivos que não se explicam racionalmente, já que nesse
caso, segundo ele, a idéia de racionalidade deve ser relativizada: “Um
psiquiatra pode qualificar de ‘ritual privado’ o contínuo lavar as mãos de um
neurótico compulsivo, ao passo que para este se trata de um procedimento
higiênico racional”4.
Além disso, é necessário
lembrar que em 1986, depois de um duro processo repressivo movido contra o uso
da bebida, a ayahuasca foi autorizada pelo (extinto) Conselho Nacional de
Entorpecentes. Após uma forte movimentação reivindicatória por parte das
diversas religiões ayahuaqueiras — e com base num estudo que, envolvendo
antropólogos, psicólogos, médicos, policiais, juristas etc., chegou à conclusão
de que o uso de ayahuasca não oferecia riscos aos participantes dessas seitas
—, estabeleceu-se a descriminalização do uso específico para rituais religiosos,
em nome da preservação das liberdades religiosas constitucionais. Isentaram-se
de proibição as duas plantas usadas na preparação da bebida, mas não o DMT
isoladamente, seu principal psicoativo, que continua proscrito até hoje. Esse
estatuto especial da ayahuasca tem enfrentado contestações, e em 31 de dezembro
de 2002 a Secretária Nacional Antidrogas convocou um novo estudo sobre o
assunto.
No entanto, parece-me
equivocado imaginar que tais peculiaridades do uso de ayahuasca impeçam o
tratamento da questão mediante uma discussão mais ampla e profunda, que envolva
o consumo contemporâneo de substâncias psicoativas legais e ilegais. Por isso o
artigo de MacRae — que prossegue uma reflexão já desenvolvida em outro trabalho5
e cujos estudos tiveram papel central na luta pela legalização do uso religioso
da ayahuasca — ressalta o papel do controle social exercido internamente entre
os membros do Santo Daime, que evita um padrão de uso destrutivo da bebida. Os
conceitos trabalhados por MacRae se inspiram em estudos do médico
norte-americano Norman Zinberg e do cientista social holandês Jean-Paul Grund,
que perceberam entre usuários de substâncias psicoativas três elementos
decisivos na definição do que se poderia chamar “padrão de uso”: a substância
utilizada, o setting e o set6. Grosso modo, pode-se resumi-los assim: os efeitos bioquímicos
desejados e que cada substância específica proporciona, que variam
decisivamente; o setting seria o
contexto social do uso, o ambiente em que se consome a substância e a maneira
pela qual ela é adquirida; já o set é
entendido como as características individuais do usuário, o que envolve sua
concepção de mundo e características psicológicas. Outro trabalho anterior, de
Howard Becker, identificou entre usuários de maconha norte-americanos uma rede
de informações sobre os efeitos da erva que servia como conhecimento comum
passado de usuários experientes para novatos, impedindo que certas condições e
formas de uso consideradas negativas se mantivessem7.
Esses exemplos demonstram as
possibilidades de um debate mais intenso nos estudos sobre a ayahuasca e outros
psicoativos. A separação hierárquica entre o que seria do domínio do religioso
e o que seria secular faz que a discussão sobre o consumo da ayahuasca se
distancie do debate mais profícuo sobre o consumo de substâncias psicoativas no
mundo contemporâneo. A suspensão da proibição da bebida, por se basear
exclusivamente na idéia de liberdade de culto religioso, criou uma contradição
com conseqüências na própria relação entre as religiões ayahuasqueiras, além de
ameaçar a pétrea separação entre as religiões, o indivíduo e o Estado. Os
conflitos entre a UDV e suas congêneres, que envolve inclusive o uso de
maconha, evidencia que o Estado, ao conferir liberdade exclusiva a determinadas
religiões pelo fato de possuírem sentido apenas em seu contexto, dá a essas
religiões o poder de decidir o que é um ritual de “verdade” e o que não é, bem
como veta ao indivíduo a liberdade de escolha entre qualquer tipo de percepção
mística, religiosa ou filosófica, mesmo que ela seja inteiramente inédita.
É evidente que a liberação
do consumo de ayahuasca representou um avanço inédito ao considerar de fato a
influência de fatores socioculturais na política oficial sobre substâncias
psicoativas8, mas hoje assistimos a uma disputa por determinada
pureza ou verdade religiosa que, como é bem sabido pela antropologia, não pode
ter vencedores. Numa analogia grosseira, poderíamos pensar num Estado que
proibisse o consumo de álcool para todos os cidadãos com a exceção dos cultos
cristãos, mas apenas aqueles autorizados pelo Vaticano, excluindo por exemplo
os rituais da Igreja Ortodoxa... Se em determinado momento foi estratégico o
argumento da liberdade religiosa para que a própria sobrevivência dos grupos
fosse garantida, já está na hora de ayahuasqueiros e pesquisadores encararem a
questão de um ponto de vista mais amplo, que não exclua a riqueza do repertório
social e religioso que envolve o uso de ayahuasca e tente pensá-lo no interior
de uma sociedade que não permite ao indivíduo escolher quais substâncias pode
usar, seja por proibi-las, seja por estimulá-las. Como afirma o próprio MacRae,
isso é necessário “para fazer face à visão, ainda predominante em nossa
sociedade, que insiste em abordar o tema do uso de psicoativos de maneira
simplista, atentando somente para definições de cunho farmacológico, deixando
de dar a devida importância a suas dimensões psíquicas e socioculturais e
manifestando grande intolerância perante a idéia de que possa haver um emprego
espiritual de qualquer dessas substâncias, todas elas genericamente
consideradas ‘drogas’” (p. 458).
(1)
Lévi-Strauss, Claude. “Uma introdução à obra de Marcel Mauss”. In:
Mauss, Marcel. Sociologia e antropologia. São Paulo: EPU, 1974 (esp.
pp. 25-26).
(2) Ver por exemplo Karniol, Isac G. “Cannabis sativa e derivados”. In: Seibel, Sérgio D. e Toscano, Alfredo Jr. (orgs.). Dependência de drogas. São Paulo: Atheneu, 2000; Carneiro, Henrique. Amores e sonhos da flora: afrodisíacos e alucinógenos na botânica e na farmácia. São Paulo: Xamã, 2002.
(3) Cf. Benedict, Ruth. “Ritual”. In: Encyclopedia of the social sciences.
Nova York: Macmillan, 1948, p. 396.
(4) Leach, Edmund. “Ritual”. In: Enciclopedia internacional de las ciencias sociais. Madri: Aguilar, 1976, pp. 383-384.
(5) MacRae, Edward. Guiado pela Lua. São Paulo: Brasiliense, 1992.
(6)
Zinberg, Norman. Drug, set and setting.
New Haven: Yale University Press: 1984; Grund,
Jean-Paul C. Drug use as a social
ritual. Roterdã: IVO, 1998.
(7) Becker, Howard S. Outsiders: studies in the sociology of deviance. Nova York: The
Free Press, 1966.
(8)
Cf. MacRae, Edward. “A importância dos fatores socioculturais na determinação da política
oficial sobre o uso ritual de ayahuasca”. In:
Zaluar, Alba. Drogas e cidadania:
repressão ou redução de danos. São Paulo: Brasiliense, 1994.
Mauricio Fiore é mestrando em Antropologia pela FFLCH-USP e membro do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos.
Publicado na Revista Novos Estudos CEBRAP, nº 66,
julho de 2003, pp. 198-202.