A reinvenção do uso da ayahuasca nos centros urbanos. Dissertação de Mestrado em Antropologia Social, Unicamp, 2000.
As religiões ayahuasqueiras brasileiras, sobretudo a União do Vegetal (UDV) e o Santo Daime, vêm se espalhando pelos grandes centros urbanos brasileiros e para o exterior a partir da décadas de 80 e 90. Um desdobramento deste processo é o surgimento de novas modalidades urbanas de consumo da ayahuasca : pequenos grupos experimentais que utilizam a bebida em atendimento psicoterapêutico em vivências no universo new age , em contextos relacionado às artes, como no teatro e na música, ou mesmo em atividades com os moradores de rua da cidade de São Paulo. Estes pequenos grupos em formação foram denominados neo-ayahuasqueiros. Tais sujeitos vivem uma tensão entre, por um lado, rejeitar os modelos religiosos “tradicionais” das matrizes ayahuasqueiras (Alto Santo, CEFLURIS, Barquinha e UDV) e, por outro, não cair na prática representada como uso profano de drogas. São então fabricados novos tipos de rituais e elaborados discursiva e simbolicamente referenciais filosóficos, existenciais, terapêuticos e mesmo religiosos, que introduzem rupturas significativas no universo de consumo da ayahuasca no Brasil. Neo-ayahuasqueiros estão inseridos numa rede urbana de consumo da ayahuasca , onde há uma circulação constante de informações, conhecimentos, pessoas, substâncias e capital. Esta rede faz parte do campo ayahuasqueiro brasileiro que interliga os diversos grupos tidos como tradicionais e atravessa em alguns casos nossas fronteiras, atingindo curanderos sul-americanos ou mesmo “xamãs” (pós-)modernos oriundos de países do primeiro mundo. Estas novas modalidades urbanas de consumo da bebida de origem amazônica estão ligadas a processos mais amplos que vêm ocorrendo na modernidade. A pesquisa contribui para a compreensão do campo ayahuasqueiro brasileiro em seu contínuo processo de fissões e reinvenções, assim como a natureza e dinâmica de novas religiosidades urbanas.