voltar para Página InicialTesesNatureza de mulher, nome de mãe, marca de negra: Identidades em trânsito e políticas do corpo na comunidade quilombola de Boa Vista dos Negros. Dissertação de mestrado em Antropologia Social, Universidade Federal de Rio Grande do Norte, 2010. .

Natureza de mulher, nome de mãe, marca de negra: Identidades em trânsito e políticas do corpo na comunidade quilombola de Boa Vista dos Negros. Dissertação de mestrado em Antropologia Social, Universidade Federal de Rio Grande do Norte, 2010. .

Ana Gretel Echazú Böschemeier

As políticas de saúde destinadas às mulheres da comunidade quilombola de Boa Vista são, de forma geral, as mesmas  destinadas ao resto das mulheres da região rural do Seridó norte-rio-grandense e também as que correspondem as regiões marginais do Brasil inteiro. Aqui, o corpo feminino é concebido sob parâmetros universalizantes que o tornam uma entidade homogênea e comparável com os outros corpos femininos a partir da sua tradução em índices, taxas e estatísticas. Nesse sentido, postulamos que são corpos nus, cuja intervenção não leva em conta os traços exteriores, aqueles chamados de culturais, como marcadores de identidade. Por outro lado, a noção de Saúde da Mulher Negra proposta por recentes políticas de Estado em âmbito nacional, mostra-se inexistente na comunidade. O corpo que exalta-se hoje a partir dos parâmetros da reivindicação étnica na comunidade é um corpo que se afirma como negro, mas também belo, jovem e, sobretudo, forte; aonde a noção estatal de saúde não penetra. Desta forma, as duas políticas concebem sujeitos sociais diferentes.  Porém, existe outro espaço, que é o espaço das práticas vernáculas, no qual as mulheres experimentam sim a articulação entre a feminilidade e a negritude, mas sob outros parâmetros que são local e historicamente delineados. Aqui, tanto as trajetórias das mulheres quanto as redes de parentesco e cuidado locais conformam-se como especialmente significativas, ajudando a compreender as concepções sobre o corpo das mulheres desta comunidade, e revelando a importância da maternidade como princípio ordenador de identidades sociais. Para isso, foi feito um trabalho de observação participante, com realização de uma série de 30 entrevistas com mulheres de Boa Vista e foi implementado um estudo das redes de parentesco organizadas ao redor do termo mãe. Assim, demonstramos que existe um espaço prenhe de significados sobre o corpo feminino e a feminilidade que é construído a partir de uma interpretação local da tríplice condição de mulher, de mãe e de negra. “Natureza de mulher, nome de mãe, marca de negra” (Women´s nature, mother´s name, black´s mark): Identities in transit and body politics in the quilombola community of Boa Vista dos Negros. Master Thesis in Social Anthropology, Universidade Federal de Rio Grande do Norte, 2010. Health policies aimed at women of the quilombola community of Boa Vista are, in general, quite similar to those aimed at rural women of the Seridó region, in the state of Rio Grande do Norte, as well as to health policies aimed at women in other peripheric regions throughout Brazil. In these policies, the female body is conceived according to universal parameters that transform it into a homogeneous entity, allowing comparisons with other female bodies once they are translated into indexes, rates and statistics. In this sense, they are regarded as naked bodies, and external traits, i.e. cultural traits, are not considered as identity markers. However, the notion of “Health of the Black Woman” [“Saúde da Mulher Negra”], recently introduced in national health policies, does not exist in this particular community. The community claims that ethnic parameters for public policies aimed at women should regard them as not only being black, but also beautiful, young, and above all strong, a conceptualization of the female body that the State’s official position on health is unable to address. Evidently, the two policies have different conceptions of the social agents. However, there is another space, the space of folk practices, in which women are both feminine and black [negritude], but according to locally and historically defined parameters. In this space, the women’s trajectories, as well as their local webs of kinship and care are especially significant in helping us understand the particular conceptions of the female body that are imagined and practiced by the Boa Vista community. They also reveal the importance of maternity as an organizing principle of social identities. According to the method of participant observation, a series of 30 interviews was conducted with Boa Vista women and a survey was conducted of local webs of kinship and care organized around the term mãe. Results showed the existence of a space with a wide range of meanings of the female body and feminity constructed from the local interpretation of the triple condition of mulher, mãe and negra.